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O Samba é Nosso: Os gays invadem a comunidade do Carnaval

O SAMBA É NOSSO

Seja trabalhando nas escolas ou se jogando nos ensaios, os gays invadem a comunidade do Carnaval

Zezé e sua tão falada cabeleireira há décadas dão o grito da consciência de que o carnaval é sim, frequentado por gays e toda a comunidade colorida. Hoje, por mais que existam pessoas com a tesoura na mão, prontas para acabar com a brincadeira do folião, há quem diga que o carnaval é uma festa gay e que Zezé poderia tranquilamente dar pinta e até bater-cabelo.

Carnavalescos, estilistas, maquiadores, passistas, travestis e drags em destaque, o número de profissionais LGBTs na festa não é pequeno. Isso sem falar dos héteros que, assumindo a brincadeira da inversão de papéis, se vestem de mulher e das festas e escolas de samba criadas especialmente para o público. Uma participação que ajuda a mover a máquina do carnaval.

"Carnaval sem o gay no meio não é carnaval. Estamos na fantasia, na produção, na arte, no samba, na atitude. Sem o gay, a festa fica chata, pouco colorida. Somos a cara disto tudo", defende o passista das Rosas de Ouro, Rick Callado (foto ao lado), que há 18 anos tem história nas escolas de samba. No Rosas, ele participa do grupo "Renovação" e é destaque ao lado de 13 homens e 30 mulheres.

"QUERIA SER RAINHA DE CARNAVAL"
O carnaval está no sangue! É o que dizem Rick, o pernambucano servidor público Bruno Cavalcanti e a artista paulistana Ioio Vieira de Carvalho. Ao comentarem a paixão pela festa e pelo ritmo que embala o sambódromo ou blocos, todos garantem que foram criados em rodas de samba e que sabem sambar como ninguém.

"Não tem como não se sentir empolgado com aquela música, com esta coisa louca que é o samba, o carnaval. Eu vou para dançar, gosto de sambar, já faz parte de mim. Outras pessoas gostam de ir para assistir e acabam entrando no clima. A alegria é contagiante", afirma Bruno, que também diz ser fã do samba de raiz e passará o carnaval nos blocos de Recife.

Destaque da Mocidade Alegre, a drag Ioio revela que aos 7 anos, nutria um sonho: ser rainha de bateria. "Sempre apanhava do meu irmão, que era um dos diretores da Gaviões da Fiel, quando tocava no assunto. Nesta época, eu via algumas drags no carnaval, e queria ser igual", lembra.

Em 1997, quando a Mocidade homenageou o design Hans Donner, ela realizou o sonho e saiu pela primeira vez como "mulher prateada". "Como não tinha noção de maquiagem, fiquei mais parecendo um cachorro molhado", brinca ela, que começou a participar dos concursos de Rainha do Carnaval Gay. "Mas só levava o Miss Simpatia", diverte-se.

"EU QUERO MAIS É BEIJAR NA BOCA"
O modelo carioca Tiago Silva (foto abaixo), de 27 anos, já reúne várias histórias de carnaval. Ele, que já desfilou na Unidos da Tijuca em 2007 e 2008, afirma que é possível fazer um amor de carnaval vingar. "Todo ano é uma história diferente. As pessoas ficam com a libido mais aguçada, todo mundo fica com todo mundo… Mas acho que é possível encontrar um amor", defende ele, que está conhecendo melhor um folião que beijou em um bloco de 2009. "Curiosamente me reencontrei com ele agora. Ficamos juntos há três anos, foi ótimo, mas depois ele desapareceu. Só agora nos encontramos de novo e parece que desta vez vai vingar", torce.

Já Bruno não leva a sério as ficadas, uma vez que "ninguém está ali para encontrar um amor". "Não tenho boas lembranças desses amores de carnaval. Toda vez que fiquei com uma pessoa e gostei, a vi ficando com outro logo em seguida. Às vezes nem fica, mas você fica com esta ideia na cabeça", declara. Ele recorda que em uma festa passou por uma saia-justa quando um homem, acompanhado da namorada, pediu um beijo. "Eu não queria e estava nervoso, porque meu namorado estava no banheiro e poderia chegar, mas o cara não me soltava. Além disso, a namorada dele estava muito brava", conta.

CORTA O CABELO DELE, CORTA O CABELO DELE!
Embora a festa seja carnal, os prazeres da carne são oferecidos com muita cautela aos gays. Para Bruno, apesar de os homossexuais serem responsáveis pela festa, a postura do gay em um baile ou em uma escola de samba deve ser contida. Pelo menos não explícita como a dos héteros.

"Vejo que o gay tem que ir para curtir o samba, porque se tentar paquerar, o negócio não é tão bem quisto. Existe uma cultura machista, em que o hétero é impulsionado a pegar todo mundo e o gay tem que se controlar. Em Recife, você vê um ou outro gay beijando o namorado, mas o comportamento não pode ser o mesmo da pegação HT", defende.

Rick diz que o gay é respeitado nas escolas de samba, mas que nem sempre pode manifestar carinho com seus parceiros. "A Rosas respeita bastante, mas também exige respeito. Usamos chapéu, calça, roupa mais comportadinha e não é permitido que fiquemos nos beijando. Mas isso é uma coisa que eu prefiro também", garante.

A modelo travesti Patricia Araújo (foto abaixo), que já desfilou em carros de destaque na Caprichosos de Pilares, Grande Rio e foi musa da Porto da Pedra, revela que uma vez quase foi colocada para fora de um camarote no Rio de Janeiro por preconceito. "Uma atriz global não gostou de ver que o marido estava me olhando. Falou que pessoas como eu deveriam morrer e pediu para que me tirassem de lá. A sorte é que tenho muitos amigos no carnaval", diz ela, que passará a festa de 2012 na Bahia.

Ioio diz, todavia, que os presidentes ficam de olho para ver se a comunidade LGBT é bem recebida e se está rolando algum tipo de discriminação. "Ninguém incita o preconceito".

O SAMBA MANDOU ME CHAMAR (MAS POUCA GENTE FOI!)
Enquanto alguns foliões da comunidade aproveitam o momento para festejar, outros simplesmente ignoram. Rick conta que teve namorados que não gostavam e implicavam com o seu envolvimento com o samba. "Pensam que carnaval é putaria, mas para mim é outra coisa. Minha família faz parte desta festa, fundou até uma escola de samba em Santo André, então é um momento muito importante para mim", declara.

E se pedissem para escolher entre um amor e o samba? "Escolheria o carnaval, com certeza. A pessoa já me conheceu assim, então não vou deixar de fazer nada por causa dela. Deve gostar de mim pelo que eu sou e faço", defendeu.

Bruno diz que as novas gerações ainda preferem escutar exclusivamente pop – Lady Gaga, Rihanna, Katy Perry – mas que com o passar dos anos começam a se permitir escutar outros estilos. "Até porque já tem maturidade para entender a música, a letra, o que ela representa. Não ficam tão preocupados em dançar loucamente. Não vejo preconceito, mas também não vejo aceitação", diz.

WILLIAM BONNER ME ELOGIOU
Envolvida com a Mocidade durante todo o ano, o momento de maior emoção para Ioio ocorreu em 2004, quando sua escola venceu. "Foi a primeira vitória depois de 23 anos".

Já Patrícia elege o melhor momento quando o jornalista William Bonner a elogiou no carnaval de 2007. "Eu estava entre várias mulheres da Caprichosos e eles falaram: ‘Bem sois vós entre as mulheres’. Depois, passou o aviãozinho da Globo e o William, que não sabia que sou travesti, falou que eu era uma das mais belas mulheres do Brasil. Foi um momento de glória", comemora.

Já para Rick, o melhor momento no carnaval ocorreu há quatro anos, quando se viu diante de um grande problema: estava sem verba para a escola de samba de Santo André. "Estava praticamente sem nada para apresentar na véspera. Mas consegui uma ajuda da Blue Space, que forneceu figurinos e algumas montagens. Resultado: conseguimos fazer o desfile, e mais, fomos os campeões".

UMA ILUSÃO
Samba, festa, beijo na boca… Tudo parece uma grande ilusão. Carnaval é a época que você faz tudo aquilo que você sempre quis por alguns dias, mas que nunca teve coragem. Bruno filosofa: "É como se fosse um mundo a parte, uma fantasia: hétero querendo se vestir de mulher, beijando gay, pegando travesti na frente de todos. Depois vem a quarta-feira de cinzas e tudo acaba. Fica na história. A famosa história de carnaval".

*Matéria publicada originalmente na revista A Capa#53

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